Nos momentos de tragédia, como que se calam as palavras. Perante o horror, dizer o quê? E, no entanto, não podemos deixar o vazio tomar conta. Mesmo curtas, as palavras são o nosso escudo e a nossa arma.
Há uns anos, numa iniciativa de Jorge Silva Melo e do Det Åpne Teater de Franzisca Aarflot, fui a Oslo assistir à leitura encenada de Octávio no mundo, uma peça breve que escrevi para atores de 15-16 anos no âmbito do PANOS da Culturgest. Começava assim:
1
Só um palco com uma cadeira de madeira. OCTÁVIO, um rapaz de ténis vermelhos, e INOCÊNCIO, um rapaz de óculos, estão parados a meio do lugar. Durante um tempo não dizem nada.
INOCÊNCIO É isto. (Pausa. Octávio olha à volta.)
OCTÁVIO Sim. (Pausa. Olha outra vez.) Não tem assim muita coisa.
INOCÊNCIO Não.
OCTÁVIO Há aquela cadeira.
INOCÊNCIO Talvez esperasses um sítio diferente.
OCTÁVIO E há bastante espaço, isso é bom.
INOCÊNCIO Talvez estivesses à espera de um lugar mais preenchido, se é essa a palavra, mais agitado. Com luzes a acender e a apagar e botões onde se pudesse carregar para fazer acontecer alguma coisa.
OCTÁVIO Imaginei-o de outra forma, só isso.
INOCÊNCIO Talvez paisagens de puxar que nos mudassem de país em segundos. Agora a selva, agora a neve, agora uma cidade.
OCTÁVIO Imaginei mais mobília, acho.
INOCÊNCIO Agora a paisagem surrealista, hiper-realista, clarinetista, da nossa cabeça. (Pausa. Os dois olham à volta.)
OCTÁVIO Sim, não está nada mal. “Clarinetista?”
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