sexta-feira, 31 de março de 2023

Não é por nada

Não é por nada, mas o guião da democracia norte-americana deve estar a ser escrito por uma qualquer I.A.

quinta-feira, 30 de março de 2023

Sobre uma fotografia de Jack Guez

O dia é a nossa bandeira. Somos maiores do que nós. As nossas vidas são aqui e agora e para sempre. A palavra desfraldada, uma casa de vento. O dia é a nossa bandeira.

quarta-feira, 29 de março de 2023

Film noir

É importante lembrar como, no começo do film noir, é central a questão da fé. (A propósito de You Only Live Once, de Fritz Lang, que passou há pouco na Cinemateca.)




terça-feira, 28 de março de 2023

Polaroide do mundo

"The old dear stories of possibility. No one wanted them anymore, but nothing had replaced them." (HarrowJoy Williams)

segunda-feira, 27 de março de 2023

Um bom dia para ler o que Luis Miguel Cintra escreveu "NO DIA MUNDIAL DO TEATRO DO ANO 2019 DEPOIS DE CRISTO"

Breve excerto: "O Teatro tem sabido construir-se em função da sua responsabilidade moral? Perante a decadência moral de uma sociedade monstruosa na eficácia com que está a trabalhar para o egoísmo e o conforto individual, máscaras do poder do dinheiro, transformando-o no único motor da vida dos cidadãos, que cegamente gastam nisso a meia dúzia de anos que dura a nossa vida, nós, teatro que fizemos, ou que deixámos que nos levassem a fazer? Soubemos preparar os outros para 'a vida do mundo que há-de vir'?"

sexta-feira, 24 de março de 2023

Trotinetas 2

Trotinetas elétricas, tiradas do rio: lamacentas e torcidas, tornaram-se arqueologia. O futuro está passado. 

quinta-feira, 23 de março de 2023

Não teria feito mal ao debate parlamentar de ontem se alguém tivesse lido em voz alta um poema de "O problema da habitação — alguns aspectos", de Ruy Belo

 I

QUASI FLOS


A morte é a verdade e a verdade é a morte


Tão contente de vento, ó folha que nomeio

como quem à passagem te colhesse,

palavra de que tu, ó árvore, dispões para vir até mim

do alto da tua inatingível condição


De muito longe vinda, inviável lembrança

indecisa nas mãos ou consentida

por alguma impossível infância

E a alegria é uma casa recém-construída


Face melhor de todos nós, ó folha

dos álamos nocturnos e antigos visitados pelo vento,

no calmo outono, o dos primeiros frios, sais

do ângulo dos olhos, acolhes-te ao poema

como no alto mês de maio a flor imóvel do jacarandá


Não há outro lugar para habitar

além dessa, talvez nem essa, época do ano

e uma casa é a coisa mais séria da vida




Ruy Belo

terça-feira, 21 de março de 2023

Assobiam


"As pessoas que há muito tempo trazem em si uma mágoa habituaram-se a ela, assobiam e ficam muitas vezes pensativas." 


(Tchékhov, aconselhando a atriz Olga Knipper a deixar-se levar pelos pensamentos em cena — tirado de "Olhai a Neve a Cair — Impressões de Tchékhov", de Roger Grenier, trad. Manuel de Freitas, ed. Húmus)

segunda-feira, 20 de março de 2023

Trotinetas

Na avenida larga, os guiadores das trotinetas "jovens" e "tecnológicas" projetam sombras de cruzes, umas atrás das outras, um cemitério inclinado.

sexta-feira, 17 de março de 2023

A proverbial convocatória

No que vai além do óbvio, a convocatória de Roberto Martínez parece um provérbio chinês: alguns que jogam acabaram para a seleção, alguns que acabaram jogam na seleção.

quinta-feira, 16 de março de 2023

A montra

Na montra do café do bairro, uma bela instalação de caixas de whisky. Em primeiro plano, um cartão com letras, digamos, garrafais, avisando: "caixas vazias".

terça-feira, 14 de março de 2023

Recortes de artigo do New York Times sobre despedimentos na empresa dona do Facebook e do Instagram

artificial intelligence

the owner of Facebook and Instagram, said that it planned to lay off about 

10,000 employees

13 percent of its 

work force


on Tuesday

a “year of efficiency”

restructuring 

on Tuesday


In November, 

artificial intelligence

laid off more than 11,000 people

13 percent of its 

work force 


to become a “metaverse” company, 

connecting people to an immersive 

digital 

world through 

virtual-reality 

headsets and applications


Reality Labs unclear if

chatbots, which are built on

artificial intelligence

will want to use metaverse products







(recortado daqui)



segunda-feira, 13 de março de 2023

Kenzaburo Oë

Leio a notícia da morte de Kenzaburo Oë. Vem-me à cabeça uma imagem lida num livro dele: um miúdo pequeno, no Japão de 1945, ouvindo o imperador na rádio e sofrendo o choque de perceber que, afinal, o imperador-deus tinha uma voz humana. 

sexta-feira, 10 de março de 2023

As línguas portuguesas

Há aquele poema de Sophia que afirma que "Quando Helena Lanari dizia o 'coqueiro'/ O coqueiro ficava muito mais vegetal". 

    Em sentido contrário, um verso de Drummond — "à sombra de muro úmido" — faz-me pensar como o agá torna mais húmida a humidade.

quinta-feira, 9 de março de 2023

A inflação das lágrimas

Podia ser o título do relatório da ASAE sobre as margens médias de lucro bruto dos retalhistas (citado no Público de hoje). A margem mais alta é na cebola: acima de 50%. 

quarta-feira, 8 de março de 2023

Em vez de smartphones, bandeiras com frases do Almada

"Será exactamente nem científico nem falso, ao mesmo tempo." (Almada Negreiros)




(da nota ao leitor, em "Nome de Guerra", de Almada Negreiros)

terça-feira, 7 de março de 2023

Insólito e grandioso

"Civilização é o esforço insólito e grandioso para não nos vermos nus e simultaneamente a nostalgia profunda de uma impossível nudez." 


(Eduardo Lourenço — "O Nu do Século XX Ou Morte Sem Transfiguração")

segunda-feira, 6 de março de 2023

Tropeçar

Na revista New Yorker, os poemas aparecem sem aviso, no meio dos textos jornalísticos. Na edição de 27 de fevereiro, vem um chamado Duetde Daniel Poppick, que começa por falar do "espaço em branco entre palavra e música", ligando-o ao tempo entre o relâmpago e o trovão. 

    Lembrou-me a definição de poesia, ou melhor, do poema, de Paul Valéry: "essa hesitação prolongada entre o som e o sentido". 

    Talvez os jornais devessem seguir esta ideia antiga da New Yorker. Tropeçar num poema não só pode atirar o leitor para um lugar diferente — os tais "espaços em branco" onde acontece o espanto e uma inteligência de tipo mais plástico ou musical —, como o fará ler as notícias, as reportagens e os artigos com outra cabeça — uma cabeça disponível para essa fenda entre as coisas, onde a interrogação não é perda mas ganho. 

    Além de que, num mundo de informação às toneladas, em "tempo real" mas fatalmente pela rama, seria uma forma de o jornal em papel marcar a sua diferença. Contra os canhões, tropeçar, tropeçar!

quinta-feira, 2 de março de 2023

quarta-feira, 1 de março de 2023

Fala, O'Hara!

 "It is even in prose, I am a real poet."


(tirado do poema "Why I am not a painter", de Frank O'Hara)