quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

O Papa no autocarro


Sim, talvez eu não consiga não gostar de um filme de Nanni Moretti. Mas também é verdade que guardo a lucidez mínima para perceber que Querido Diário é melhor que Abril, ou a distância necessária para escolher o Moretti de O caimão antes do Moretti de O quarto do filho, por exemplo.
Seja como for, tenho de dizer que estou em desacordo total com o consenso crítico em torno de Habemus Papam. A reação geral foi, para usar um eufemismo, morna; este seria um Moretti suave, “maduro”, amansado... Não, não e não. É um filme belíssimo, único, talvez o mais duro do cineasta de Roma. Um filme sério, sim, seguro, sim, mas também maravilhosamente louco como só podem ser as visões dos grandes mestres.
Neste tempo de robôs e fraude, Habemus Papam consegue o impossível: justapor a provocatória “estranheza” da comédia e das ideias à delicada “empatia” do drama e das personagens. Ou, traduzindo por nomes: juntar Moretti e Piccoli.
Sendo um filme “agnóstico” que não foge às perguntas, claro que Habemus Papam cai mal neste nosso momento. Mas o problema não está na tela, está nos nossos olhos. Este tempo de austeridade ideológica e entretenimento mentiroso é que está demasiado “morno” e “suave” para um cinema vivo que não tem medo de pensar e imaginar e tudo ao mesmo tempo.
Tão comovente, tão desequilibrador no melhor sentido, ver o Papa no autocarro a sofrer “normalmente”. Ou, na cena com a psicanalista Margherita Buy, apanhar Michel Piccoli fingindo a dor de ator que deveras sente.
Habemus Papam é um filme imenso, que dura o tempo justo de uma decisão. E, tu, estás de que lado?

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