segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Correspondente Estrangeiro: O pleonasmo da chuva

A sabedoria local diz que as praças de Lisboa não estão preparadas para a chuva. Mas a sabedoria local engana-se. Às vezes, de perto, não se consegue ver tudo. Com as suas calçadas de filme antigo, com as suas linhas desenhadas à mão, as praças lisboetas estão preparadíssimas para a chuva. Quem nunca pensou, ao atravessar o Camões ou a Praça da Figueira, que bem que ficaria isto com uma carga d'água em cima? Lisboa está mais que preparada para a chuva. O problema é quando a chuva começa mesmo a cair. 
O vagabundo gordo do Calhariz emagrece de imediato, o par de namorados torna-se ímpar tão juntinho debaixo do guarda-chuva, a senhora de saia é como uma lágrima negra que a praça vertesse canastrissimamente. De um momento para o outro, os lisboetas todos introvertidos, pensativos, poéticos, pingões. Que segredo traz a chuva? Dá ideia que, atrás da pedra das casas e do chão, alguma coisa se dissolve. Uma cidade feita para a água do mar, não para a água do céu. Mesmo os cavalos das estátuas se apoucam, desiludidos na escuridão.
Não, a chuva em Lisboa não tem nada de meteorologia, é um fenómeno mais para os lados do metafísico.
No minuto em que a água começa a desabar, aparecem vendedores de guarda-chuvas à porta das estações de metro, dos centros comerciais, das pastelarias. Homens morenos — sempre homens, sempre morenos — nascidos do alcatrão. Dizem que os guarda-chuvas são bons e baratos. Falam daquilo como quem fala de fruta ou doces. Guarda-chuvas de chocolate? Uma proteção tenrinha para a água divina. Mas, à saída do metro do Chiado, o vendedor deve estar com pouca sorte hoje. Paradão, como um bengaleiro estrangeiro na calçada portuguesa.
Debaixo da chuva, Lisboa estilhaçada; feita em mil minúsculas cidades de pernas para o ar nas poças de água. Um silêncio tão frio. Até que, da roda do táxi, salta uma onda gigante. Um guarda-chuva a esbracejar, uma sombra encharcada, um palavrão, e volta tudo ao mesmo. 
E o pior é que era totalmente desnecessária esta chuva. Continuam tão feias as manchetes desfocadas atrás dos plásticos no quiosque que a chuva é um acréscimo burro. A cidade estragada pelo pleonasmo. “Chover no molhado”, dizem os locais. E têm toda a razão.

domingo, 29 de dezembro de 2013

“O PS não é confiável como partido da oposição"

Pacheco Pereira tem toda a razão — este PS de Seguro é abaixo dos mínimos. E o alerta para um namoro PS-PP também nos deve fazer pensar. 

No ano novo, uma nova esquerda?

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Reportagem 10



“Não escrevo ‘colunas espirituosas’. Pinto o retrato da época. É para isso que os grandes jornais existem. Não sou um repórter, sou um jornalista; não sou um cronista, sou um poeta.” (Joseph Roth)

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Yo, Orlando! (pardon my English)




Functionally Literate is Burrow Press' reading series in Orlando, hosted by Jared Silvia.
(Thanks, Jared!
And thank you, Burrow Press and Ryan Rivas!)

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Hoje, às 19h, no MUDE: objetos verdadeiros não identificados



(eu ajudo à festa com duas coisas de dizer: Texto Masculino da República Democrática Europeia/ Texto Feminino da República Democrática Europeia)

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Assim, mesmo quando ganhamos, perdemos

"Exagera na sensatez e a tua pirâmide não será mais que um monte", diz o famoso provérbio Azteca. Talvez Jorge Jesus devesse levantar os olhos dos calhamaços pascalianos onde anda a queimar as pestanas para pensar um bocado nisto. Claro que os grandes males vêm de trás, mas não tenho dúvidas: se ontem temos arriscado a glória como é próprio do Glorioso, os deuses do futebol teriam sido mais simpáticos connosco. Não é superstição, é só uma fezada mesmo. Em vez disso, o que é que fizemos? Quais pirâmides quais quê, presenteámos os parisienses com um jogo de salamaleques, tudo só ais e uis, faça favor, não vossemecê primeiro. Coisa mais mole. Assim, claro, mesmo quando ganhamos, perdemos. 
Digo “excesso de sensatez” porque, enfim, aprecio a arte do eufemismo. Mas, têm razão, ele há um tempo para eufemismos e um tempo para dizer as coisas mesmo. Falemos grosso então, que esta não é época para florzinhas. A verdade é que o grande princípio de jogo deste mister que nos calhou na rifa tem um nome nada pascaliano. Começa com "cag" e acaba com "ufa". E isso, pois, não comove nenhum deus lá nos olimpos. 
Mas o grande mal vem muito de trás, sim. Toda a ideia filipevieirística de olhar para o Benfica como uma montra de jogadores… Pode correr bem um ano, com sorte, mas não é maldade que se faça ao maior clube do mundo e arredores. Pondo a coisa na língua do paleio dominante, o que o futebol do Glorioso precisa é menos especulação e mais economia real. Menos medinho e mais ambição. Uma qualquer ideia de jogo, no mínimo! A ver se, perdidas as europas, ganhamos ao menos aos aroucas.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Punho fechado, alto no ar, gritar

Mandela!

Um poema de Frank O'Hara

AUTOBIOGRAPHIA LITERARIA


Quando era criança
brincava sozinho num
canto do recreio
completamente só.

Odiava brinquedos e
odiava jogos, os animais não
se davam bem comigo e os pássaros
voavam para longe.

Se alguém andava 
à minha procura eu escondia-me atrás de uma
árvore e gritava “Sou
órfão.”

E aqui estou eu, o
centro de toda a beleza!
a escrever estes poemas!

Imagina!

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Jornal Local: a bolinha

Nos degraus da estação Baixa-Chiado, quem sobe da plataforma do metro para a saída, uma bolinha, plim, plim. Foi uma rapariga, “Ah!...”, que a deixou cair. A bolinha salta na direção do vazio absoluto da linha de metro, vai-se perder para todo o sempre — mas o rapaz para-a com o pé. 
A bolinha segue para o lado da parede, sã e salva. Aliviada, dá ideia, rodando sobre si própria numa espécie de suspiro. E afinal não é uma bolinha qualquer, oh não. Jornal Local estava lá e viu.
É uma verdadeira pérola.