quinta-feira, 4 de abril de 2013

Aeroportos, aviões, cinema

Um aeroporto é como aquele filme do Altman. Histórias que se definem em poucas pinceladas, misteriosamente, com uma clareza no limite do realismo. Por exemplo, um casal de sessentas e tais num corredor do terminal 1 da Portela a experimentar óculos. Falam o inglês suave e nasalado da América, mas o homem traz uma boina galega e a mulher um cajado de caminhante. A jovem vendedora segura um espelho sobre o ombro como um pirata com o seu papagaio.
No retângulo sem moldura o rosto da americana experimenta óculos escuros. Que ideia estranha, óculos negros na superfície de um espelho.
Um pouco atrás, o homem da boina está de boca aberta, suspenso; um peregrino à espera da revelação.
E já está. De repente tudo explode com uma gargalhada branca. “No wonder they're so nice!” diz a mulher quando a vendedora anuncia o preço.

No avião vejo um filme onde o protagonista inventa um filme para conseguir uma coisa no mundo. No céu, sobre as nuvens, as pessoas olhando para as imagens, cada uma com o seu ecrã, como se olhassem para espelhos.

O avião levanta voo em Newark. Baldios, estradas, armazéns, tudo ficando mais e mais pequeno, mais e mais nítido. Depósitos brancos como aspirinas gigantes depositadas sobre a terra. Cinema real!

Por exemplo, o miúdo pequeno fugindo aos pais na direção da porta de embarque. A mãe chama-o, e depois o pai também. Mas ele continua. Um miúdo de quatro, cinco anos?, cabelo cortado à escovinha. Passa por baixo da fita azul, lá vai ele.
Avançando na direção do filho, o homem agora fala mais forte. O miúdo para, mas não se vira para trás. E, já que ele não está olhar, o pai sorri.

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