Tinha de acontecer, mais tarde ou mais cedo. Por mais optimistas que nos esforçássemos por ser; por mais que, antes de cada partida, arejássemos os corações com boa ilusão e saudades do futuro; por mais que as inspirações dos craques benfiquistas nos pusessem pontos de exclamação na alma; por mais que o futebol-maravilha nos fizesse imaginar impossíveis - sabíamos que tinha de acontecer, mais tarde ou mais cedo. Não dá para “crer” e “querer” tanto tempo contra números de pedra, e a diferença pontual para o primeiro lugar parecia tão pesadona como a grande pedra do estádio do Braga. Sim, no fundo, sabíamos que tinha de acontecer. E, no entanto, caros amigos, como é triste.
Alguns dirão que a nossa entrada domingueira anunciou logo o fracasso. De facto, notou-se demais a falta de Pablo Aimar, glorioso maestro, arquitecto e filósofo da equipa. No belo estádio que Souto Moura compôs em parceria com a Paisagem, jogávamos pelo manual, sem ousadia, sem rasgo. O que, em futebolês, se diz “jogar para o calendário”. Também faltava Salvio, o mais original dos extremos, um repentista ligado à terra. E, em geral, mexíamo-nos sem estamina, sem espírito. Carregávamos um cansaço sentimental - não é impunemente que se ganha jogos seguidos nos últimos segundos, em estilo de drama épico -, as pernas desconectadas do coração. Outros dirão que o que nos tramou foi aquela cartolina vermelha que atirou García, o nosso espanhol da táctica, para o arquitectónico balneário. Eu cá acho que a nossa derrota começou no golo de Saviola.
Não me interpretem mal. Foi um golo felicíssimo: uma alegria, como pusemos aquela “bola parada” em movimento para dentro da baliza bracarense. O chuto d’El Conejo é mais difícil do que parece e merece mais do que o rótulo técnico de “recarga”. Foi um tiraço com a bola tropeçada no ar, um chuto na única fracção de segundo possível, pelo único espacinho livre. Um óptimo golo, sim. Mas, a partir daí, aburguesámos. Caímos na tentação do “futebol confortável” e pagámos as consequências.
Que triste, pois - mas olhemos para a frente. De alguma forma, esta derrota em Braga até nos alivia e liberta. Agora podemos dar-nos ao luxo de não ser nem optimistas nem pessimistas. Digamos com Almada Negreiros que agora não há nenhum mal-entendido entre nós e a vida, e vamos lá ganhar a Liga Europa. Com futebol-alegria, sim, estádios de pé, corações ao alto.
(no JN de ontem)
(no JN de ontem)
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